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15 abril 2011

A nova métrica do capitalismo

Por: Giuseppe Cocco*
Originalmente publicado na INOVA
Economista abre o debate sobre a necessidade de uma nova forma de se medir a riqueza de um país

A atual crise do capitalismo global acelera as reflexões e aporta novas urgências ao debate sobre indicadores de mensuração da riqueza (PIB) e da inovação diante do novo papel do conhecimento. Na modernidade industrial, produziam-se mercadorias por meio de conhecimento; no regime de acumulação contemporâneo, produz-se conhecimento por meio de conhecimento. O conhecimento não é mais instrumental voltado a um fim (o bem), mas contém seu fim dentro dele mesmo, num processo que, justamente, não tem fi m. Incerteza e singularização (customização) dos produtos, dos produtores e dos consumidores determinam a substituição da informação pelo conhecimento enquanto atividade refl exiva de julgamento. A informação permitia instaurar um mesmo mundo que os atores compartilhavam com base na mensurabilidade e equivalência generalizada: aquela dos preços. O conhecimento diz respeito a uma multiplicidade de mundos. Uma produção de mundos: aquele veiculado pela marca, o marketing, a propaganda, o design. O cálculo (quantitativo - informacional) deve “fazer as contas” com o julgamento (qualitativo - comunicativo): os saberes sociais, longe de serem unitários e indiscutíveis, se tornam múltiplos e controvertidos.

A crise permite (ou até obriga) uma ressignificação da relação entre consumo e produção que passa necessariamente pelo enfrentamento do enigma do valor e esse, por sua vez, implica a redefinição da convenção que junta dialeticamente trabalho e emprego, trabalho e capital (sendo que a ficção financeira não se reduziu apenas à alavancagem do crédito por meio dos derivativos, mas diz respeito também à ilusória equação constituída pela difusão social do trabalho e a fragmentação de sua remuneração). Usando a metáfora da colmeia e da polinização, podemos dizer que a crise do valor e a crise fi nanceira são resultado da nova condição do trabalho numa sociedade cujas convenções continuam a ser aquelas da colmeia. A análise tradicional do valor (e da inovação) se limita à produção (output) de mel, que pode ser negociado no comércio, e, pois, a uma racionalidade instrumental voltada a um fi m (o mel), apropriável sob as formas de direito de propriedade privada ou pública (estatal). Mas o valor criado pelo trabalho indireto, imaterial, relacional (de polinização) é “n” vezes mais importante que o trabalho material (direto) de produção de mel. Esse descompasso foi preenchido pelo consumo alavancado pelo crédito. Os desafi os de uma nova métrica são exatamente aqueles do reconhecimento das dimensões produtivas da polinização e, pois, da construção de instituições e convenções adequadas a essas redes cognitivas e não mais presas pela lógica de poder da colméia.

A produção e inovação por propagação polinizadora é aquela dos enxames de empresas territorializadas (APLs), movimentos (pontos de cultura, trabalho colaborativo em rede Web), territórios de cidadania, bacias de trabalho metropolitano, renda (o Bolsa Família). Precisamos de indicadores de “enxameamento” que reconheçam a dimensão produtiva e não deixem esgotar-se sua dinâmica propagadora.

*Giuseppe Cocco é professor de economia da Universidade Federal do rio de Janeiro.

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